Repouso mais uma vez os olhos
em ti, mar salgado, mar bravio. Quantos lares destroçaste!, quantas lágrimas
choradas para que os homens fossem teus, ó mar!
Eu, que vejo onde acabas e não começas, que vejo as tuas ondas beijarem, ao espraiam-se, as areias douradas e se desfazem logo em espuma; eu, que falo contigo e imponho o silêncio das palavras, que te acalmo e embalo até adormeceres feito lago; eu que tenho o dom de derramar as lágrimas que vão diluir o sal da tua bravura; eu, por quem esperas há muito e não me entrego enquanto tiver a magia de vencer, mar salgado, mar tenebroso, que beijas, por vezes com doçura, as areias da praia e também fazes recuar com o passar dos anos as rochas que bloqueiam o teu avanço, enquanto o coração bater e a minha razão ordenar, mar tenebroso, mar hostil, não julgues que vou ouvir as canções que as tuas sereias repetem em caminhos onde sonho que estou a passar!
O outro eu ainda está contigo por aí. No fundo das tuas profundas águas. Sabes?, ninguém o viu regressar. Abriste o caminho e ele passou. Mar adentro, avançou. Porque só queria procurar. Procurar... E tu não o deixaste voltar.
Esse homem que te acalmava (estranho dom!) e que fingias escutar, esse que já não sou, tinha a força e o dom de ler em ti o que ninguém lia. De ver no voo das gaivotas o que ninguém via. Gaivotas de asas feridas a descerem para as águas, como ele, procurando, procurando, até que não voltavam. Esse outro homem, que tinha a força e o dom, e amava as plantas e os astros, que chorava as mágoas tragadas pelo passado que não esquecia, que te acalmava nos dias em que te erguias irado e lançavas as tuas ondas salgadas sobre a praia que dizias amar, esse homem que falava contigo e tu ouvias, calado, feito lago, que trazia para junto de ti o sonho antigo... que procurava esse homem senão a sua solidão gémea?, que lhe deste, ó mar?
Não me revejo nele. Já não sou quem te acalmou e mar adentro avançou.
Estás irado. Perdeste-o. Não foste tu. Então, que outros mares o levaram?
Já ninguém sabe como acalmar-te. As tuas ondas estão cada vez mais altas, bem sei. Não as vou desafiar. Aprendi o que é perder. Agora, só me resta vencer. Porque o outro gostava de todos. E eu só vou gostar de mim. Aprender a só receber. A sonhar que estou sempre a vencer.
Hoje não te vou acalmar. Não me mostres o caminho aberto. Lança a fúria das tuas ondas sobre as rochas, leva contigo a areia e os seixos, os barcos e os incautos. Leva tudo contigo, mas não me mostres o caminho. Sê, principalmente, como és. Como te vejo. Um mar bravio e salgado. Sem vida. Sem alma. Sem segredos para desvendar. Não. Não me abras o caminho que o meu caminho é outro. Abriu-se o coração. Agora sou diferente porque descobri que já não sou quem fui. Agora sou outro. Estranho dom, o de dar e não receber. Não consigo imitá-lo. Vou evitar a tua imensidão, as tuas sereias melodiosas e fatais. E vou para longe.
Eu, que vejo onde acabas e não começas, que vejo as tuas ondas beijarem, ao espraiam-se, as areias douradas e se desfazem logo em espuma; eu, que falo contigo e imponho o silêncio das palavras, que te acalmo e embalo até adormeceres feito lago; eu que tenho o dom de derramar as lágrimas que vão diluir o sal da tua bravura; eu, por quem esperas há muito e não me entrego enquanto tiver a magia de vencer, mar salgado, mar tenebroso, que beijas, por vezes com doçura, as areias da praia e também fazes recuar com o passar dos anos as rochas que bloqueiam o teu avanço, enquanto o coração bater e a minha razão ordenar, mar tenebroso, mar hostil, não julgues que vou ouvir as canções que as tuas sereias repetem em caminhos onde sonho que estou a passar!
O outro eu ainda está contigo por aí. No fundo das tuas profundas águas. Sabes?, ninguém o viu regressar. Abriste o caminho e ele passou. Mar adentro, avançou. Porque só queria procurar. Procurar... E tu não o deixaste voltar.
Esse homem que te acalmava (estranho dom!) e que fingias escutar, esse que já não sou, tinha a força e o dom de ler em ti o que ninguém lia. De ver no voo das gaivotas o que ninguém via. Gaivotas de asas feridas a descerem para as águas, como ele, procurando, procurando, até que não voltavam. Esse outro homem, que tinha a força e o dom, e amava as plantas e os astros, que chorava as mágoas tragadas pelo passado que não esquecia, que te acalmava nos dias em que te erguias irado e lançavas as tuas ondas salgadas sobre a praia que dizias amar, esse homem que falava contigo e tu ouvias, calado, feito lago, que trazia para junto de ti o sonho antigo... que procurava esse homem senão a sua solidão gémea?, que lhe deste, ó mar?
Não me revejo nele. Já não sou quem te acalmou e mar adentro avançou.
Estás irado. Perdeste-o. Não foste tu. Então, que outros mares o levaram?
Já ninguém sabe como acalmar-te. As tuas ondas estão cada vez mais altas, bem sei. Não as vou desafiar. Aprendi o que é perder. Agora, só me resta vencer. Porque o outro gostava de todos. E eu só vou gostar de mim. Aprender a só receber. A sonhar que estou sempre a vencer.
Hoje não te vou acalmar. Não me mostres o caminho aberto. Lança a fúria das tuas ondas sobre as rochas, leva contigo a areia e os seixos, os barcos e os incautos. Leva tudo contigo, mas não me mostres o caminho. Sê, principalmente, como és. Como te vejo. Um mar bravio e salgado. Sem vida. Sem alma. Sem segredos para desvendar. Não. Não me abras o caminho que o meu caminho é outro. Abriu-se o coração. Agora sou diferente porque descobri que já não sou quem fui. Agora sou outro. Estranho dom, o de dar e não receber. Não consigo imitá-lo. Vou evitar a tua imensidão, as tuas sereias melodiosas e fatais. E vou para longe.
Talvez regresse um dia. Quando chegar o tempo da eternidade. Só na eternidade
as tuas águas vão abrir de novo o caminho e guardar o segredo que as minhas
cinzas, de memórias apagadas, saberão encontrar. Sob ti, em berço de espuma
branca e salgada, irei então adormecer, mas como semente que amanhã germinará.
Continuarei à procura de uma alma gémea que existe algures, desencantada como eu, sofrida, mal amada, ressurgida das cinzas. Mas não em ti.
Chegou o tempo de dizer-te adeus. Os meus olhos não mais se vão perder no imenso deserto que foste e és. Perdoa-me, mar, se te vejo assim. Um mar de tempestades interiores e de revoltas brutais.
E o outro homem que acalmava o mar...?
Esse, talvez alguém o inventou. Outro mar o levou. Um mar irado como tu. Um mar de ondas levantadas. De tempestades interiores. Por vezes, um mar feito lago. Um mar que muda todos os dias. Um mar tal como eu sou!
Continuarei à procura de uma alma gémea que existe algures, desencantada como eu, sofrida, mal amada, ressurgida das cinzas. Mas não em ti.
Chegou o tempo de dizer-te adeus. Os meus olhos não mais se vão perder no imenso deserto que foste e és. Perdoa-me, mar, se te vejo assim. Um mar de tempestades interiores e de revoltas brutais.
E o outro homem que acalmava o mar...?
Esse, talvez alguém o inventou. Outro mar o levou. Um mar irado como tu. Um mar de ondas levantadas. De tempestades interiores. Por vezes, um mar feito lago. Um mar que muda todos os dias. Um mar tal como eu sou!
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