Gostava de fazer chover e encontrar a última verdade no sonho
que se esfuma de tanto o ter sonhado. Mas não passo de um feiticeiro que viu o feitiço virar-se contra si!
Sinto que volto das cinzas revolvidas, já frias. Como frio estava o teu corpo quando os vermes te comeram. Mas tenho
outra mágoa. Como não sou feiticeiro, impotente, deixo os nossos sonhos de ontem nascerem e morrerem.
Que interessa agora que voltes todos os dias com o teu sorriso triste, o olhar fixo para lá do horizonte, se prometes sempre uma mão cheia de nada...?
Assim, deixo que todos os sonhos nasçam e morram, dia após dia. Só eu nasci uma vez e vou morrer uma vez. Angustiado por não saber porque imitaste as folhas das árvores, que amarelecidas, desistiram de viver. Essas tinham um motivo...
Sou um aprendiz de feiticeiro. Enfeiticei-te, mas deixei que o feitiço se quebrasse.
Triste por não fazer chover,
vejo, por detrás da vidraça, a chuva a cair lá fora. Miudinha. Chuva de molha
tolos. Juro que não fui eu, porque não passo de uma franja de um feiticeiro. E assim, chove onde o acaso quer. Lá
fora. Cá dentro. Cá dentro, onde vou morrendo aos poucos e os meus neurónios sangram (lugar comum; quantas vezes disse que os meus neurónios sangravam?).
É isso. Estou à espera da inevitabilidade da morte. A única certeza do feiticeiro que não sou.

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