O céu pode esperar

Se Alguém manda em nós que se acuse. Preciso urgentemente de descobrir um novo caminho fora de todos os caminhos por onde já passei.
Para quê?
Se mandas em nós, sabes bem para que quero o caminho.
Agora dizes que não sabes. Quem Te manda cerrar os olhos e também fazer orelhas moucas, deixar fluir o curso imprevisível da vida, permitir proteções de anjos da guarda, fadas-madrinhas, duendes, bruxas, entes cabeçudos e também aquelas coisas chifrudas que vêm do sítio onde faz sempre calor?
Afinal deste-me força para subir ao alto do monte para daí lançar-me num voo planado feito águia à espreita da sua presa.
E subi. E fiz voo planado. Mas fui um predador falhado e logo desci até à minha insignificância. É arte que não é para todos.

Se pudesse ver-Te, certamente via-te a sorrir. 

Foi para me pores à experiência, não foi?

Vá lá, desenrasca-te. Só tu sabes de futuros e isso tudo. Bem me lembro que criaste o paraíso do Adão e da Eva, sabendo de antemão o que ia acontecer ao homem. Também quero seguir o meu destino que bem sabes qual é. É que parece que tudo está a andar para trás e eu não sou caranguejo.
Claro que já tenho a minha Eva. Por favor, dá-nos um caminho novo e pouco esburacado.
Qualquer caminho serve?
É que não quero ter complicações com fadas-madrinhas e anjos da guarda, nem tão pouco ter os maus encontros de que já Te falei.
O quê...?, tens um caminho novo para o céu?
Obrigado. O céu pode esperar.
Ah!, deixa-me que Te diga que bem me saíste um amigo da onça daqueles que (sem ofensa) afocinham no prato só para chatear. Guarda-o bem guardado para nós. O caminho, claro. Bem sabes que ainda ontem a conheci e não quero perdê-la na primeira encruzilhada. Temos muito...
Muito... o quê?, perguntas com ar de gozo.
Amor!
Afinal de contas sabes ou não sabes o que é?
Não gozes. Ainda há dessa raridade na Terra...
Porque é que finges que nunca me ouves quando falo Contigo?
Vamos, amor. Dá-me a mão. Temos ainda muito para andar. E não há de ser nada. Ele disse que não... mas talvez. Acredita, amor. As portas do céu não se fecham assim, sem mais nem menos...